Com um equipamento assustadoramente lento, Fernando Alonso faz o possível para manter seu nome entre os melhores em todos os finais de semana. Desta vez, a falta de potência do motor Honda mais uma vez o prejudicava em suas voltas rápidas, sobretudo na longa reta Kemmel do circuito belga. Assim, para tentar descontar a desvantagem, Fernando contornou a desafiadora curva 12 (ou Pouhon) de Spa-Francorchamps sem tirar o pé do acelerador, o que muitos pilotos não conseguiam, mas em seguida seu carro perdeu potência.
Parecia normal (ainda mais se considerado o histórico recente de defeitos mecânicos da unidade de potência japonesa), se não fosse uma curiosidade absurda: o sistema ERS (um motor alternativo que recupera energia a partir da energia cinética a partir dos freios e energia térmica dos gases do escapamento) proporciona 160 cavalos de potência "extra" na impulsão do veículo. Contudo o sistema fica à disposição do piloto apenas 33,3 segundos por volta, isto é, bem menos do que o tempo gasto em uma volta em qualquer circuito. Logo, os pontos em que será utilizado tal sistema são definidos previamente a partir de simuladores e computadores (pessoalmente prefiro o termo artificialmente). No caso específico do piloto espanhol, o sistema era acionado, dentre outras maneiras, a partir da aceleração de Fernando, que possibilitava o reconhecimento eletrônico da posição do carro em relação à pista, e identificasse seus pontos de ação. Ao mudar o estilo de pilotagem em apenas uma curva (já que não contornava a Pouhon "de pé cravado" usualmente), a habilidade de um piloto único como o espanhol, foi suficiente para arruinar sua volta, uma vez que o sistema perdeu o referencial e não proporcionou a potência "extra" de 160 cavalos nos pontos programados em sequência.
Eis aqui uma reflexão: trata-se de uma corrida de carros, naves espaciais ou pilotos? Agora realmente estou confuso! Se fosse uma corrida de pilotos, venceriam apenas os mais corajosos que, em primeiro lugar buscariam estudar pontos específicos do traçado em que poderiam ser mais rápidos, (como nesse caso de Alonso); já se fossem carros: trata-se da única competição em todo o globo em que são utilizados milhares de comandos "extra-automobilísticos" que não acelerar, frear, virar o volante e passar marchas, alguns até realizados a partir de uma ação executada fora do "carro" em questão; sobrou apenas uma opção, e ao olhar para o volante (ou central de comando?) e para a unidade de potência (unidade de potência!) estou cada vez mais convicto de que é a certa.
Não desmereço aqui naves espaciais ou quaisquer outras máquinas fascinantes. Apenas fico assustado com a tamanha confusão: uma competição automobilística em que são utilizadas "quase-naves espaciais". Refiro-me ao fato de que as tecnologias hoje empregadas nos carros não são essencialmente mecânicas. Dentre as diversas engenharias, a que é primordial em um carro (desde os primeiros inventos no final do século XIX e início do século XX) é a mecânica. Atualmente, a tendência é contrária a isso, uma vez que os avanços eletroeletrônicos têm se tornado bem mais figurantes, o que não condiz com uma corrida de carros de Fórmula 1.
Aqui vale outra argumentação: os automóveis urbanos não necessariamente devem seguir à risca tais preceitos, uma vez que o objetivo é a locomoção mais eficaz e confortável (dentro do possível, mais rápida). Em uma corrida de carros de Fórmula 1 necessitam-se, obviamente de carros de Fórmula 1: aqueles mais puros e mecânicos, que constituem toda a gloriosa história do esporte e que seus fãs tanto amam. Então é necessário, para que retornem o motor à combustão, o volante e o piloto, quebrar um paradigma histórico: desatrelar pesquisa e desenvolvimento tecnológico (aplicadas em sua maioria nos automóveis particulares) dos carros de F1. Qualquer aplicação de progressos da engenharia nesse quesito resultaria (se já não resulta) em uma categoria bem diferente do que já foi a tradicional F1.
No embate entre pilotos, motores e carros contra engenheiros, unidades de potência e naves espaciais fico com o primeiro lado.
Guilherme Jamil
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